09 setembro 2009

Os Bebedores de Cerveja


Textos precisam ser repetidos. A verdade dita muitas vezes também se espalha e é aceita. Os inteligentes devem despertar. Deles dependem os demais. O futuro se desenha nos inteligentes. Eles farão a travessia da humanidade, não os outros. Sempre foi assim. Os homens não são amorfos e indistintos. Temos muitos sabores. Retire desse bolo um Platão, um Newton, e voltamos à Idade da Pedra. Poucos saberiam recriar o mundo. Falemos sobre o consumo de álcool.


Textos precisam ser repetidos. A verdade dita muitas vezes também se espalha e é aceita. Os inteligentes devem despertar. Deles dependem os demais. O futuro se desenha nos inteligentes. Eles farão a travessia da humanidade, não os outros. Sempre foi assim. Os homens não são amorfos e indistintos. Temos muitos sabores. Retire desse bolo um Platão, um Newton, e voltamos à Idade da Pedra. Poucos saberiam recriar o mundo. Falemos sobre o consumo de álcool.

Textos precisam ser repetidos. A verdade dita muitas vezes também se espalha e é aceita. Os inteligentes devem despertar. Deles dependem os demais. O futuro se desenha nos inteligentes. Eles farão a travessia da humanidade, não os outros. Sempre foi assim. Os homens não são amorfos e indistintos. Temos muitos sabores. Retire desse bolo um Platão, um Newton, e voltamos à Idade da Pedra. Poucos saberiam recriar o mundo. Falemos sobre o consumo de álcool.
Álcool é assunto maldito. Todos bebem, logo, não se discute. Argumentos em favor do álcool são frágeis. Aludem a amigos, alegria, festa, comunhão. O álcool é a droga mais consumida. A cerveja, a bebida alcoólica mais utilizada, assim, a cerveja é responsável pelos altos índices de criminalidade e de mortes. A cerveja altera o comportamento. O processo é químico, não romântico.
Dizer que a cerveja integra pessoas é supor que os urubus interagem nos lixões. Dezenas de seres bêbados não valem um único ser são. Mas os homens fogem da lucidez. Têm dificuldade de sair do estado infantil, tratam a vida como um jogo, uma brincadeira. Vivem entre mentiras. Justificam o consumo de álcool pelo niilismo. Numa lógica em que Deus fracassou, fracassaram ideologias, amores não vieram, restando o álcool. Porém, estranhamente, os bebedores, se brasileiros, são apaixonados e crentes, não abrem mão da motriz antropológica. Afirmam beber por espontânea vontade. Falam do exercício da liberdade. Falam de felicidade. A cerveja liberta, somos um país de homens livres. Um país de homens felizes. Somos?
O capítulo das mulheres é mais drástico ainda. Elas bebem como os homens, mas o álcool lhes causa efeitos mais penosos. Nas mulheres, o álcool é metabolizado de forma diferente. Como elas possuem menor quantidade de água no organismo, então, o álcool é menos diluído, o que potencializa seus efeitos. Elas também registram uma quantidade menor das enzimas (ADH gástrico) responsáveis pela quebra e neutralização do álcool para a corrente sanguínea. Nas mulheres, a maior parte do álcool vai direto para o fígado.
A Organização Mundial da Saúde (2005) afirma: mulheres que bebem cerveja há aproximadamente vinte anos, em 100% dos casos, possuem lesão no fígado. E se, nesse mesmo período, o consumo médio foi de seis garrafas de cerveja por semana, então, as chances dessas mulheres desenvolverem cirrose hepática será de 50%. As mulheres bebedoras sofrem de uma série de sintomas físicos: dor de cabeça, cansaço, enjôo, irritabilidade, ansiedade, visão dupla, perda gradual de memória etc. Para a OMS (id), mulheres que bebem há mais de dez anos são dependentes. Um único mês sem o uso do álcool as faz “experimentar desconforto emocional, ansiedade, confusão mental, tremores e insônia”. Ao atingir o cérebro, o álcool destrói os neurônios – que são células que não se regeneram. Necrópsias realizadas com bebedores de cerveja detectaram que eles tinham cérebros menores, se comparados a não bebedores. Análises subseqüentes revelaram que os cérebros dessas pessoas regrediram em massa. Entre outros efeitos danosos, a cerveja também diminui o cérebro (Oxford, 1986) O álcool ultrapassa a placenta e atinge o feto. O líquido amniótico fica impregnado de álcool. Mulheres bebedoras comprometem seus filhos mesmo antes de concebê-los. (Revista Brasileira de Obstetrícia, 2001).
As bebidas liberam instintos. Bebida e sexo são um binômio, uma tautologia. Alguns estudos mostram que: 1. O uso de álcool dinamiza padrões psíquicos de baixa freqüência (Kabat-Zinn, 2006), ou seja, desperta os aspectos mais grosseiros da nossa natureza animal. Por outro lado: 2. A meditação desencadeia harmonias, inclusive curas. Mas quantos meditam? Os evangélicos talvez estejam certos: o álcool ascende os demônios adormecidos, os padrões abomináveis da nossa estrutura gênica. O arquétipo de Sodoma e Gomorra tomou conta dos nossos dias. Doutos, executivos, garis, mendigos, políticos, artistas, trabalhadores e desocupados compõem esse grande ritual dos bebedores de cerveja. Uma maçonaria de linguagem própria, discriminadora dos sóbrios.
O corpo é o templo que nos foi dado para passar o tempo. As pessoas cuidam melhor de seus carros e de suas casas do que de seus corpos. Se o corpo é o veículo, o motorista é a mente. A nossa capacidade mental é sempre limitada pela qualidade do corpo. Um veículo doente, refém do álcool, será muito difícil de ser conduzido, por melhor que seja a mente. Chico Buarque diz, numa de suas letras, que “Sem a cachaça ninguém segura esse rojão”. Imaginemos, literalmente, um bêbado segurando um rojão! (...) A verdade é inversa. Não são fatores exógenos os principais vetores dos vícios (Messas, 2005), mas conformações da cromátide. Portanto, Chico Buarque et.al. não bebiam por conta da ditadura militar, se assim o fosse, cessariam de beber a partir da abertura política. Citar um famoso nos conduz a outra constatação: muitos bebem imitando ídolos. Jovens idolatram Raul Seixas e, por adorarem suas canções, reproduzem também o comportamento do homem para além do mito.
Esses poetas, pintores, filósofos e músicos beberam por ignorância e contingência. Não era necessário que bebessem. Produziriam uma obra mais elevada se despertos. A partir da segunda metade do século XX, bebe-se inspirado na tradição intelectual européia, no ceticismo do pós-guerra, no existencialismo ateu. Muitos universitários começaram a beber álcool, a freqüentar bares, a ser sensualistas e a sofismar, inspirados por franceses. Tudo imitação, metonímia, falta de inteligência. Se Marx: álcool; se Joyce:álcool; se amores: álcool; se fofocas: álcool; se Flamengo: álcool. Álcool na tristeza, álcool na alegria, álcool todo dia, todo dia álcool. Porém, a introdução do álcool na dieta humana comprometeu a espécie toda.
Em 1984, Mourr & Benson demonstraram que nos bebedores de cerveja as sinapses realizam menores operações e com menor eficácia. Quem bebe cerveja dança, ri, fala pelos cotovelos e goza muito. Mas tem o cérebro menor. Pensa menos. Pensando-se menos, bebe-se mais. Bebendo-se mais, pensa-se menos e bebe-se mais,... Inútil samsara.
Há, entre os bebedores, uma classe que acumula um problema adicional. São os professores. Neles, recai uma questão: como educar jovens e, ao mesmo tempo, beber, grunhir, agir alucinadamente? Não me refiro aos aspectos de ordem moral, mesmo porque ninguém mais se importa com nada disso, a maioria dos pais e mães também bebem e, muitas vezes, junto aos filhos. O caos se instaurou - vivemos o Kali, o Tempo da Noite Negra. Refiro-me à Voz que nos sopra à consciência e que representa o Ser (nossa essência), ante o Nada (nossa cultura). Refiro-me à Ethos, que deveria nortear o educador numa escala centrífuga.
O processo pedagógico é infinito, toda aula é uma prelibação, um ato de fé. Enquanto cá estivermos, manifestos, perseguiremos o ideal da construção de uma sociedade mais evoluída. Magistério e drogas não combinam. Ou um ou outro. Essa Noite, que há séculos nos atormenta, vai passar. O homem é um projeto. Sua carne e sangue ainda se confundem com o chimpanzé. Uma longa jornada remissiva à nossa condição oceânica nos aguarda. O professor precisa ser exemplo, precisa explicar para os seus alunos as coisas desse mundo. Ensinar-lhes sobre as cruéis leis do comércio, sobre os vendedores de sonhos, sobre homens que exploram homens e animais, sobre um tempo em que a propaganda leva milhões aos bares, e sobre o lucro das grandes empresas que fabricam certos líquidos amargos, destilados ou fermentados, induzindo todos a bebê-los, ficarem doentes, débeis, e ainda pagarem por isso. Toda maiêutica há de ser lúcida. Ensinar é uma função dos professores, de ninguém mais. Quem somos os professores, entretanto?

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03 setembro 2009

Advogados


Advogados são bonitos. São elegantes. Vestem-se com o mais puro linho e são convenientes. Riem na hora certa. Raramente choram. Freqüentam os melhores salões de beleza. Não medem esforços para a elegância. Sapatos lustrados. Ornamentos em ouro. Advogados são bonitos. Andam de cabeça erguida. Pastas repletas. Pensamentos concêntricos. A minuta. A procuração. O habeas-corpus. A inflexão na ponta da língua. O lenço. O suor perfumado. O automóvel metálico. A casa de praia. O churrasco. Os amigos advogados.

Advogados são bonitos. São elegantes. Vestem-se com o mais puro linho e são convenientes. Riem na hora certa. Raramente choram. Freqüentam os melhores salões de beleza. Não medem esforços para a elegância. Sapatos lustrados. Ornamentos em ouro. Advogados são bonitos. Andam de cabeça erguida. Pastas repletas. Pensamentos concêntricos. A minuta. A procuração. O habeas-corpus. A inflexão na ponta da língua. O lenço. O suor perfumado. O automóvel metálico. A casa de praia. O churrasco. Os amigos advogados.
Advogados adoram discutir política. Falam de senadores, deputados e presidentes de forma íntima. Utilizam um maravilhoso vocabulário. Expressões latinas, português clássico. Gastam quinhentas linhas para dizer que o réu é culpado. Mas também gostam de futebol, assinam a Veja, periodicamente vão a motéis. Pagam com cheque ou cartão, expostos em trabalhadas carteiras de couro. Advogados preferem jantar em restaurantes, onde falam de negócios. Contam piadas. Narram o caso do cliente burro. Dos cinco mil dólares a mais. Da procuração de mão beijada. Do vídeo-laser penhorado. Depois, arrotam discretamente e vão ao toalete. Lavam as mãos. O rosto. Corrigem o penteado.
Advogados multiplicam-se. A cada ano. A cada dia. Crianças se preparam. Adolescentes freqüentam tribunais. Vestibulandos anseiam. Eles sabem-se superiores. Olham em volta e é só mediocridades. Por isso são contidos. Falar muito só entre os iguais. Preferencialmente silenciar, ante a estupidez. Advogados assistem avidamente aos noticiários da televisão. Embora já compreendam todos os processos do sistema. Mas é preciso dados, subsídios, inferências novas. Sonhar com litígios homéricos. Ocupar funções públicas vitalícias. Passar pelas ruas, observando o olhar respeitoso dos demais. Ser chamado de doutor. Tirar dúvidas. Apresentar soluções. Memorizar códigos inteiros. Dar aulas. Corrigir provas. Conferir o saldo bancário. Sutileza. Perspicácia. Higiene.
Moças também sonham em ser advogadas. Por isso estudam, alucinadamente. Decoram as fórmulas de Química inorgânica, treinam análise sintática, matriculam-se em mil universidades. Em quatro anos, saltos altos, cruzarão os corredores do fórum. Mãos repletas de papéis. Apressadas. Apertando botões. Computador e celular. O noivo correto. Advogado. Amigos gentis. Conversas mornas. Vinho branco e Caetano no CD. Que viver é isso mesmo, e as injustiças estão aí. Advogados se alimentam delas. Advogados se alimentam e engordam. Criam barriga. Celulite. Votam com correção. Acreditam na democracia. Dão palestras em clubes de serviços e vão dormir em paz.
Seria bom se todos fossem advogados: Garis, Professores, Poetas, Domadores de leões. Um mundo jurídico, sob gravatas e petições... Infelizmente, porém, longe disso estamos. O que vemos é um planeta irracional. Banalizado. Cru. O que assistimos são cantares de filósofos, pobres. Incomensuravelmente pobres. Discursando o absurdo. Inutilmente, divagando sobre absoluto, existência, Deus e caos. Buscando origem e fim, assustados com a fome da criança. Com o velho roto, caído. Gastando horas a fio sobre livros caducos, em trajes vergonhosos. Filósofos não têm função. São luxo. Afinal, a vida prossegue igual, mesmo que não pensemos nela. Por isso não se pode perder tempo. Tudo é rápido. A morte vem breve. Não há espaço para as loucuras de Platão, as alucinações de Nietzsche, o pensamento desconexo de Foucault. É preciso ganhar-se muito dinheiro. Literatura é lazer... Advogados têm plena consciência de tais verdades. Lamentam que ainda existam tolos. Mas nada podem fazer a respeito. Precisam casar-se. Ter filhos. Patrocinar-lhes educação, coloca-los em escolas caras, para que cresçam e possam ser alguém. Compreendem, que basta cada um cuidar de si mesmo e a ordem não tardará a vir. A vida é para ser realizada e não pensada. Determinação é a palavra. Ambição é a palavra. Trabalho é a palavra.
Filósofos ainda amam o mistério. Ainda gastam horas num pôr-de-sol. Fazem versos, ainda. Preocupam-se com ética e moral. Querem ser felizes. Antes, porém, a cultura- suas doze caras, a dúvida. O pecado. Filósofos são pecadores, essencialmente sujos e descartáveis. Pés na lama. Quase tocam o céu. Ilusão... Advogados passam sandal no rosto e vão ao Arraial d’ajuda. O mundo nas mãos. Filósofos ficam na chuva. Úmidos e sós. Contando as estrelas. Observando o caminhar das formigas. Um mundo só de filósofos não passa por sua cabeça; passam abstrações, esperanças miúdas, paixões possíveis. Os rios poluídos e os bichos extintos habitam sua alma. O fogo que queimou Giordano. As chagas do Cristo. O veneno do grego parteiro. Alvoroço, alegria e dor o compõem. Vinte e quatro horas por dia, trina o seu coração.
Advogados são prolixos. São espertos. São horizontais. Nascem advogados. Quando crianças, exigem mesada. Têm sempre à mão, a maior fatia do bolo. Para que possam rir dos que comeram pouco. Rir dos outros meninos que ficaram sem comer.

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